domingo, setembro 09, 2007

Capitu.

enchi o copo de gelo. não tinha um uísque. enchi uma garrafa de água. andei pra lá e pra cá, deixava respingar as coisas na cozinha. isso é água mineral, água mineral não se deixa respingar. num ímpeto de jogar o resto da minha sede na pia, dei mais um gole. não tinha nenhum copo limpo, nenhum, procurei as canecas, nenhuma caneca, uma só, suja. não confio nas minhas mãos limpando pratos. fiquei com o primeiro copo de gelo. o preenchi até transbordar um pouquinho com a garrafa cheia, aspirei a água, sorri feliz.
de lá pra cá ainda. pizza sobrando, frango à passarinho sobrando, faca, garfo, colher, prato, coisas sujas, ketchup fora da geladeira... hmmmm ketchup com pizza. um pedaço, dois, três, meio pedaço só. queijo brie na geladeira, queijo brie, ketchup e pizza. de novo o bebedouro, preenchi novamente o copo, não deixa pingar, não deixa. subi para o quarto. barriga estourando, imagina só se eu explodisse exatamente agora, minha coluna dói demais. vou explodir mesmo.

entro no quarto. ventilador ligado, parece que o quarto fica mais quente, luzes acesas. será, será que isso tudo aqui tem o mesmo ar de quando você foi embora? devo estar respirando.

preciso de uma faxina, todo mundo precisa de faxina. fiquei pensando se de repente era com ch. luz do banheiro acesa também. luz do banheiro é uma praga. apago. cheiro de pizza na mão direita, chocolate na mão esquerda. meus óculos escorregando para a ponta do nariz. muito óleo. vou tomar um banho.

um gole de água, paro, respiro, olho para cama. casacos, roupas, desodorante, uma caixa de giz de cera, toalha molhada, toalha molhada, almofadas, vento do ventilador, cumbucas de sorvete. livros.

olho para baixo, palitinhos do japonês de ontem, uma lata de suco de uva, pingos da minha água, um lixo tombado, sandálias.

olho para frente, celular, cumbuca de sorvete, caneca, a água, câmera, celular, outra lata de suco de uva, remédios, anel de lata, pano para limpar a mesa, computador, caderno, fotos, livros, livros, agendas, fios de cabelo, minhas mãos.

olho para dentro, esqueci do que eu era por dentro, um rim, dois rins, coração, fígado, estomago, vesícula, batata, chuchu e abobrinha.

quero que você volte.
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Capitulo dois.

acordei, ainda não era a chuva. abria uma fresta de olhos e rezava para ainda estar claro, ainda está claro, por favor. não queria a noite. voltava a sonhar. acordava de novo. liguei para o 130. duas horas ainda, duas horas e dois minutos. sonha mais, sonho com botânica, pesquisa, biologia, amigos. acordo de novo. 130 mais uma vez, já são três. daqui a pouco não vou ter mais tempo de fazer nada antes da noite. levanta, levanto, olhos grudados, meio tonta, ligo o computador, já está ligado, merda, esqueci de desligar. toca um pagode na caixa de som, quebra a caixa de som. tou pensando em tomar um banho, deixo pra depois. penso em você rapidinho, deixo pra lá. olho a caixa de remédios, preciso de um copo dágua, depois eu tomo. algumas horas passando, vou pro banho, ainda está claro, leio todas as besteiras que escrevi. penso: com o tempo as coisas vão ficando mais fáceis.
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Capitulo zero.

você veio aqui, me beijou. agora estou ouvindo Paco de Lucía. tem um ser chamado estúpido cupido falando comigo no computador. você não vem aqui faz tempo, por tanto, isso é uma lembrança. você veio aqui, me beijou. pedi para alguém me trazer um copo dágua, tomei o remédio. você disse que eu não tinha problemas psicossomáticos. não tenho. meus problemas estão nos neurônios. psiconeurológicos?. eles pulsam. pulsam. pulsam e ficam pensando. um absurdo, outrora quis ser animal. menos animal que sou. um cachorro. o seu cachorro. morreria de catapora se não fosse de saudade. isso tudo é um grande equivoco, repito para mim mesmo. talvez eu não te procure nunca mais, talvez eu suma, talvez eu doa, mas não dói mais. ouço ainda Paco de Lucía, o cara é muito bom. gosto de bom pra dedéu. é uma delícia. bom pra de-déu. estimo ter mais uns dois goles dágua, depois acaba. olho para todos os cantos, tudo continua o mesmo, só eu, que agora estou de banho tomado. acho que a chuva parou. uma pena, logo, logo, chega a noite. e o pior da noite é que não tem amanhã. amanhã é segunda e segunda não tem manhã. bebo igual passarinho, faço biquinho, mato melhor a minha sede. não era sede que eu tinha. era angústia. preciso levar essas cumbucas e esses copos e essas canecas e esses lixos pra cozinha. depois. sempre tem depois. se você tiver raiva de mim, me mate, me mate que eu vivo melhor. vivo do que não me matou. e você não mata nem abobrinha. você mataria o quê por amor? hoje a noite também não tem novela. aluguei uns filmes, vi todos com pipoca ontem. hoje escurece mais tarde e acho isso horrível, tenho a impressão de que o dia está me enganando. penso que são cinco horas, já são seis e meia. daqui a pouco, faltam trinta minutos para ser de noite. vou para a rua desejar boa tarde à todos.

tem pessoas que batem na porta. eu não atendo. não atendo nunca. nem o telefone, esse eu tirei do gancho. não carreguei o celular, ninguém quer me encontrar. ninguém vai. todo mundo, se quiser. que adianta eu adorar astrologia, o quê né. vou fazer bruxaria, só pra poder encher a água de longe. vem, vem, vem bebedouro, vem. ainda tenho um gole. a porta trancada o tempo todo, abri uns centímetros de manhã para gritar. minha alma está na parede do meu quarto. grudada, incrustada, está aqui também. pedaço de você eu nunca tive. pedaço de mim você tem de monte, mas só gosto de fazer boas trocas. dá lá dá cá. entende? dá lá dá cá.

tenho pipoca ainda, mas hoje o dia vai ser de jejum, meu domingo de jejum. quero todos os abraços.

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